Asperger e a Comedia dell’Arte – The all picture
A nossa vida com um asperger, criança ou adulto, é uma permanente caixinha de surpresas. Muito pontuada, sobretudo socialmente. Apesar da muita pontuação – pontos, pontos e vírgulas, vírgulas e demais «artilharia» gramatical – há sempre situações que escapam ao nosso controlo e que temos de gerir, melhor ou pior. Predominam as reticências... Vem isto a propósito de uma peça de teatro a que fomos assistir há alguns dias atrás. Chama-se Arlequim – Servidor de dois amos e está em cena na Sala Estúdio do Teatro Nacional Dona Maria II. É uma peça originalmente do teatro popular italiano que se insere na corrente denominada Comedia dell’Arte. Foi escrita, em 1745, por Carlo Goldoni e foi agora adaptada à realidade portuguesa com encenação de Filipe Crawford. A trama gira em torno dos encontros e desencontros de dois pares amorosos, ligados pelos equívocos pueris criados pelo vivaço Arlequim, que presta simultaneamente serviço a dois amos, sem que eles se apercebam de tal. Para quem não sabe, a Comedia dell’Arte caracteriza-se pelo uso das máscaras, o que permite aos actores interpretarem indistintamente velhos, novos, mulheres e homens, além de permitir a improvisação e a interacção com o público, pois há um texto-base, a partir do qual tudo é possível. Cada espectáculo é, por isso, diferente do outro. E é aqui, na interacção com o público, que reside o busílis da questão. Para quem não sabe também, a Sala Estúdio do Dona Maria tem apenas uma meia dúzia de filas que permite a que assistam às representações entre 100 a 150 pessoas. É neste contexto que, a dada altura da peça, no clímax de uma cena em que o dito Arlequim tentava dissimular uma carta que havia indevidamente deslacrado, ele pergunta a si próprio: «mas onde é que eu pus a carta?». Sai então da plateia uma voz de ajuda – estão já a ver de quem – dizendo o que já todos sabíamos e estávamos a ver: «está colada no rabo». A partir daí ainda se estabelece um curto diálogo entre o Arlequim e já estão a ver quem, mas a situação acaba por morrer ali, mercê de alguma pontuação paterna e materna…
Mesmo um enredo simples como era aquele, porém cheio de subentendidos, não é nunca completamente entendido…
Mesmo um enredo simples como era aquele, porém cheio de subentendidos, não é nunca completamente entendido…
Como diz o Dr. Carlos Filipe, com a propósito, eles nunca vêem «the all picture»…
2 Comentário(s):
Como eu me revejo na vossa situação... Nem precisava de ter lido até ao fim para prever o sucedido!
Pois é, sfelix, todos nós já passámos por «coisas» semelhantes. O caso, aqui, é que isto aconteceu com alguém de 18 anos... Ou seja, se fosse com uma criança, a situação até tinha graça e seria menorizada, mas com um adulto...
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