Férias e limitações sociais das família com SA...
Temos, enquanto família e à medida que a idade do meu filho avança, vindo progressivamente a estreitar e a limitar a nossa vida social. Essa tem sido uma realidade inultrapassável, que se tem agravado ao longo dos anos e que se irá extremar cada vez mais. Estou infelizmente certo disso. As férias são igualmente muito controladas em termos de opções e tudo é escolhido em favor de ambientes com limitada interacção social. Talvez devesse ser ao contrário mas não é. Nem poderá vir a ser. Eu não vou poder mudar o mundo e o nosso mundo não é o mundo dos asperger. É o mundo dos outros onde estão os asperger. E cansa-me! Cansa-me extraordinariamente a constante pontuação social da situação. Em certa medida – acreditem – sinto que tudo seria mais fácil se o meu filho tivesse, por exemplo, Síndrome de Down. Estava tudo na cara. Não me livrava dos olhares de comiseração dos outros mas contava com a sua natural tolerância para comportamentos e atitudes. Assim, continuo a não me livrar dos olhares e não conto com qualquer tolerância. Talvez um distintivo com um «eu sou autista, seja tolerante» ou qualquer coisa de semelhante pudesse resolver as coisas... Agora mais a sério – se é que esta hipótese não é a sério -, tenho de equacionar, muito sinceramente, a institucionalização futura do meu filho em parte das nossas férias. Sob pena de não termos férias. Pode parecer-vos eventualmente uma atitude merecedora de alguma sanção moral. Para já isso ficou adiado por mais um ano. Mas é isso que penso que vou ter de fazer um dia. Não sei ainda se conseguirei livrar-me das sanções do meu superego mas esse é um preço que vou ter de pagar. O problema das severas limitações sociais a que estão sujeitas as famílias com casos de Síndrome de Asperger é outro problema e decerto que não dos menores. E vejo-o pouco falado e pouco discutido na literatura da especialidade...
17 Comentário(s):
procuramos nas férias fugir um pouco à rotina sempre com consciência de que nos vamos arrepender seja qual for o destino que tomarmos. Até porque o irmão mais novo não tem que viver condicionado aos problemas do irmão aspie.
Mais uma vez este ano foi assim.
foram duas semanas de "terror" para ele para o irmão e para nós pais.
o dia começava com o mau humor e terminava da mesma maneira que começou.
"... e porque viemos de férias? só me obrigais a fazer o que não gosto; eu quero é a minha casa; não gosto da areia, não gosto da praia não gosto de sair, não gosto de passear, não gosto de brincar, não gosto da bola, não gosto da piscina, .... sempre não sempre não" tudo contra a vontade, sempre a marralhar sempre de mau humor e com comportamento explosivos que como é claro só nós o compreendemos e para os outros é má educação.
Eu compreendo que férias para o Filipe é fazê-lo sofrer; mas a familia não se resume ao Filipe, o irmão também merece a nossa atenção e merece divertir-se; depois gera-se um dilema de consciência até que ponto devemos insistir em alterar as rotinas do Filipe.
E são estas as nossas férias seja para onde formos, nunca são interessantes para o Filipe, ele só quer é que ninguém o incomode com "novidades".
Para concluir, será isto a vida toda? Sempre em função do Filipe?
Compreendo bem o que sente, caro anónimo. Penso que as respostas às suas perguntas finais terá de as encontrar dentro de si mesmo. Repare que v. próprio já se anulou, e apenas referiu que o irmão tb tem direito a férias... E v. e a sua esposa e ambos enquanto casal, já agora?
Não sei de idades estão a falar, mas julgo que já têm conhecimento da parceria que estamos ( APSA ) a desenvolver com a CASCA. No proximo dia 9 e 10 , vamos pela 2ª vez fazer actividades em conjunto. A CASCA é constituida por animadores socio-culturais e trabalham no Centro de Lazer S. João Caparica . A 1ª experiencia foi muito positiva, eles trabalham com os nossos filhos e os pais descançam. Este projecto pretende dar inicio a futura colonia de férias para os Aspies.Pode não ser solução para todos, mas será certamente para alguns.
À medida que o meu filho vai crescendo vai sendo possível dar-lhe alguma autonomia procurando conciliar a sua necessidade de rotinas com a nossa de fugir à rotina. Penso que o melhor dia de férias deste ano foi aquele em que ele ficou no hotel e nós saímos todo o dia. Como já tem 17 anos, embora com pouca autonomia, começa a ser possível deixá-lo entregue a si próprio desde que garantidas as condições mínimas de segurança. Ele ficou tranquilo e todos fomos poupados a um dia de tensão e conflitos a propósito de tudo e de nada. Quanto às pessoas com quem ele se cruzou durante o dia convém que aprendam a aceitar pessoas e atitudes diferentes, até porque no caso dos jovens com SA elas representam uma agressão social bem menor que a de muitos jovens em fase de "afirmação social".
Anabela
O caso, cara Dulce, é que estamos sobretudo a falar de jovens adultos e não de crianças ou de adolescentes. Com o meu filho, sempre tive menos problemas em criança do que agora em adulto... Uma futura colónia APSA para todas as idades ou até por segmentos etários é uma óptima ideia.
Pois é, cara Anabela, aí está uma medida interessante, isto é, férias em conjunto mas à medida de cada um. Já a adopto, sem culpa, em relação a algumas das nossas «saídas». Curiosamente, o meu filho está agora mais gregário do que nunca: quer sair, quer interagir mas fá-lo cada vez mais desadequadamente. Já quanto à adaptação dos «outros» aos «nossos», compreendo bem o que diz mas acho-a de difícil concretização... É uma questão de atitude e de educação. Teria de começar na escola. Tal como existe a disciplina de Educação para a Cidadania, poderia existir a de Educação para a Diferença ou inclui-la como módulo da Educação para a Cidadania. É curioso e verdadeiro o paralelo que faz com as atitudes dos «normais» da mesma idade, porém essas são socialmente toleradas...
Seja bem-vinda e volte sempre ao Planeta Asperger.
Descobri hoje este blog e li-o de uma vez só. Gostei do humor, da forma como descreve o seu filho, dos seus considerandos. Contudo, por vezes senti alguma inquietude com o que escreveu, sobretudo com este último tema. Não pretendo fazer valorações sobre o assunto, nem sobre os comentários que antecedem este meu, mas coloco a seguinte questão: antes dos Outros, não terão os pais de aceitar o seu filho tal qual ele é?, com as suas limitações, a sua diferença? Como podem os pais "exigir" que os Outros compreendam se, por vezes, eles próprios não o conseguem verdadeiramente fazê-lo? Afinal, todos temos as nossas limitações...
Cara Maria. Só me apetece dizer-lhe como aquela radionovela que em tempos passou: «Simplesmente Maria»... Xeque-mate.
Acho que me «leu» muito bem. E tem toda razão. Eu resumia a situação do seguinte modo: acho que racionalmente consigo entender o problema do meu filho, mas emocionalmente já não o consigo fazer tão bem: faço-o aliás bastante mal, diga-se. Já interiorizei o problema e consegui entendê-lo mas apenas à luz da razão. Nunca vou conseguir lidar bem com ele à luz das emoções e da condição de pai. Conheço-me, infelizmente, bem demais. Como alguém disse: «afinal todos temos as nossas limitações...» ;-)
Volte sempre ao Planeta Asperger, cara Maria.
Já cheguei a pensar que seria mais fácil se minha filha fosse Donw... mas tenho tentado incluí-la em todos os programas que faço com meu outro filho... mas realmente é muito difícil, até ir às compras no supermercado..
Como eu a compreendo, cara Patrícia. No meu caso, cá em casa, ele está - dentro do quadro SA, é claro - «como Deus com os anjos», sai de casa, e é «como um diabo no paraíso» (isto tentando fazer um pouco de humor com a situação). Ainda hoje mesmo tive um dia particularmente difícil com ele. Há que sobretudo ir gerindo a situação da melhor forma que se puder... Mas sempre lhe digo que me penalizo muito pela severidade com que eduquei o meu filho - antes de saber e até mesmo (embora menos) depois - mas há relativamente pouco tempo estive a ouvir uma prelecção de um especialista que me disse, na fase das perguntas, qualquer coisa do tipo: «acredite que com essa atitude em princípio preparou um adulto mais competente»... Não sei, mas isso descansou-me um pouco...
Descobri hoje este espaço. Tenho um irmão de 9 anos com asperger (ou talvez na fronteira com o "autismo de alto desempenho" como pomposamente lhe chamam). Dada a nossa diferença de idades (tenho 34 anos) tenho acompanhado e apoiado toda a sua vivência o mais que posso.
Compreendo o que dizem das férias e tempos livres...como nos damos muito bem, tento "aliviar" os meus pais o mais que posso indo buscá-lo quase todos os fins-de-semana e nas férias.
Tento sempre levá-lo a fazer programas diferentes, de preferência ao ar livre, dar-lhe "espaço" e deixá-lo "gastar energias" o mais possível. É verdade que nem sempre as coisas correm bem, às vezes até reage mal a programas que anteriormente tinha aderido plenamente. Depende dos ventos...já aprendi que o melhor é deixar passar e voltar a tentar noutra altura. A ideia de ATL's ou colónias de férias é excelente.
De qualquer forma é bom saber que há alguém que sente as mesmas coisas que nós (também já pensei que talvez fosse mais "fácil" se se tratasse de uma diferença visível aos olhos dos outros...).
Obrigada pelo espaço,
Joana
Obrigado pelo seu testemunho, Joana. Bem-vinda ao Planeta Asperger.
Sou mãe de um jovem asperger de 12 anos. Apesar de ter notado, desde os seus 5 anos, que o meu filho era diferente das outras crianças, situação que foi evoluindo até se tornar muito complicada de gerir, só há pouco mais de um ano lhe foi diagnosticada "oficialmente" S.A. (digo "oficialmente", por ter sido por um conceituado especialista, porque há já alguns anos que, depois de muito ler e de ver diversas reportagens televisivas, essa ideia não me saía da cabeça - afinal, ninguém conhece melhor os seus filhos do que uma mãe).
No meu caso, problemas de saúde graves, durante a sua primeira infância, impediram-nos, a nós pais, de gozar férias durante vários anos seguidos. Quando finalmente foi possível "ir de férias", estas tornaram-se uma tortura. Primeiro, o enorme cansaço que é tentar convencê-lo a sair de casa (normalmente, é literalmente arrastado...). Quando já estamos esgotados do esforço de o colocar no carro, espera-nos um dia cheio de críticas, de que tudo é mau, de que quer voltar para casa… simplesmente é difícil encontrar algo que o interesse. Mas, se temos a "sorte" de encontrar algo que lhe desperte a curiosidade (sobretudo quando, para lhe agradar, o levamos a contactar com algo relacionado com o seu único interesse obsessivo), não o conseguimos arrancar desse local por nada deste mundo.
Felizmente, já passou um pouco a fase em que, sempre que saíamos com ele, fosse a que sítio fosse, acabávamos na companhia de um grupo de polícias ou de seguranças à sua procura, pois distraía-se frequentemente, focando a sua atenção em coisas que o atraíam, perdendo completamente a noção de onde estava, de com quem estava, do que estava a fazer... partia para "outro mundo", sem aviso prévio e punha-se a andar em qualquer direcção. Passámos momentos terríveis, com familiares, vizinhos e polícia à procura dele, nas situações mais insólitas. Nessa fase, com o total desconhecimento do problema que o afectava e vendo que isto não acontecia com as outras crianças, pensámos que o problema era nosso… éramos uns pais falhados: não conseguíramos educar o nosso filho a ser bem disposto, responsável, maturo, educado, bom aluno, etc.
E é verdade que isto custa muito mais quando se tem um filho que, aos olhos dos outros, é perfeitamente normal; é mas é teimoso e um bocado mal-educado, porque os pais nunca lhe deram um par de “tabefes” na altura certa. Não esqueço os olhares e "recados" reprovadores de muitos professores (quase a forçarem-me para o "educar" à força do castigo) e de conhecidos e a angústia de me considerar uma mãe absolutamente falhada. Mesmo agora, que sou bem conhecedora da situação e o mais compreensiva para com o meu filho, por vezes também sou levada a esquecer-me da sua situação e a exigir-lhe um comportamento “normal”. Se é assim com os pais, reconheço que deve ser muito difícil para os outros.
Este ano, porque o cansaço já era tal que queríamos mesmo era descansar, decidimos, pela primeira vez, fazer nas férias quase só o que ele queria (se bem que o que ele mais queria era voltar para casa, como dizia todos os dias, mas fazíamos negociações diárias). Apesar de tudo, foram umas férias calmas, para aquilo que tem sido o habitual, e sem o costumeiro stress. Nunca sabíamos para onde iríamos a seguir, porque, ao longo do dia, o programa era sempre alterado por ele (quero… agora já não quero…). Mas como não houve muitas pressões da nossa parte para lhe organizar a sua vida e o deixámos mais á vontade - e o desespero era tal que só queríamos descanso (“paz e amor”) fosse lá o que fosse que tivéssemos de pagar por ele -, as coisas até acabaram por correr menos mal.
Esperemos pelas próximas férias.
Isabel
Caros bloggers,
parecem-me todos demasiado preocupados com o que os outros pensam .... temos de encontrar formas de estarmos bem, e os nossos filhos irem sendo felizes. Como li num qq livro sobre o tema, o lema deve ser "mind over matter" ... those who mind, don't matter, those who matter don't mind" .... as coisas são bem mais fáceis quando o aceitamos, e mais simples. Um dia de cada vez, e boa sorte para todos (nós).
Dá-se o caso, cara anónima, de termos de viver com os «nossos» filhos no Planeta Terra e não no Planeta Asperger... Pessoalmente, não consigo fazer essa espécie de quadratura do círculo, mas acredite que admiro os que conseguem...
Ainda bem, cara Luísa, que está satisfeita com a escola e com os professores do seu filho. Tb já «apanhei» - porventura todos nós - do melhor e do pior: a profissão docente é infelizmente terrivelmente assimétrica... Mas professores que procuram informação na net para melhor ajudar um aluno diferente é, de facto, um exemplo a registar.
Por desejo da Luísa, o seu comentário, ao qual respondi em cima, foi apagado.
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