Em torno do termo Aspie
Tenho assistido, nos textos que vou recebendo e nos comentários aqui no Planeta Asperger, à disseminação do uso da palavra aspie para designar uma pessoa com Síndrome de Asperger. Trata-se de um petir nom, simpático e carinhoso, curiosamente criado por uma asperger, Liane Holliday Willey, em 1999, e que depois se divulgou de forma maçica. A sonoridade do termo até me agrada. Eu, porém, não o uso. Nunca! Trata-se de um prurido, porventura de um escrúpulo sem sentido, mas confesso a minha enorme relutância em utilizá-lo. E explico porquê. Parece-me que o seu uso aligeira, mascara e ilude a dura realidade desta patologia sobretudo nas franjas médias e inferiores da mesma. Parece que estamos a falar dos membros de um clube ou de qualquer coisa de muito agradável e não estamos. Não conheço, aliás – mas pode ser ignorância minha – nenhuma patologia, cujos portadores tenham um petit nom. Imaginemos, por exemplo, os portadores de Síndrome de Down chamarem-se downies, ou os portadores de SIDA (AIDS) chamarem-se aidies. Dir-me-ão, agora, que eu próprio escolhi o pseudónimo de Asper, para postar estes textozinhos que por aqui vou escrevendo. É verdade e admito até que tal possa ser uma contradição. Porém trata-se de uma abreviatura do apelido do médico austríaco que deu o nome à doença, Hans Asperger, e não o acho eufemístico. Dir-me-ão, ainda, que este blogue é o Planeta Asperger e não Blogue sobre Síndrome de Asperger, por exemplo. Também é verdade mas a escolha deve-se a uma expressão de Brenda Boyd, retirada do livro Parenting a child with Asperger Syndrome, e pretende ilustrar a estupefacção das nossas crianças, jovens e adultos com asperger perante as regras sociais do Planeta Terra, onde têm de viver.
9 Comentário(s):
Já vi se tratar, carinhosamente, um filho com Sindrome de Down por “chinesinho” e até mesmo “monguinho”. Sinceramente, não me parece que estas formas de tratamento tenham como propósito aligeirar a realidade do problema. Talvez seja antes uma forma de manifestar que, apesar da diferença, e perfeitamente consciente dela, aquela criança é muito amada e acarinhada. Eu por minha parte, e naturalmente, sempre rejeitei estas formas mais “simpáticas” de tratamento. E em alguns momentos chego mesmo a usar o termo “terrível”, em vez de “aspie”. Carinhosamente, está claro! Talvez sejam as pessoas que, embora inconscientemente, ajem como eu, as que tentam “mascarar a dura realidade do problema”. Obrigada por me ter feito pensar no assunto. Bom post.
Ainda bem que foi abordada a questão do termo "aspie" que, frequentemente, é usado. Acredito que quem o faz não tem intenção de menosprezar a situação ou as pessoas envolvidas mas, de facto, soa a uma ligeireza que me parece pouca adequada. Talvez porque o meu filho já é adulto nunca fui capaz de usar essa expressão e sempre me senti mal quando observei o seu uso. Embora eu tente desdramatizar e descomplicar, tanto quanto possível, o que é educar e conviver diariamente com um jovem com estas características, a verdade é que toda a situação me inspira um profundo respeito pelo sofrimento que ela provoca nos próprio e nos seus próximos. Isso e o sentimento de frustração pela minha incapacidade para responder adequadamente às solicitações do meu filho, têm-me feito sentir desconfortável sempre que vejo utilizar-se o termo em causa. Obrigada pela sua reflexão.
Boa perspectiva, Mrs Noris. É realmente uma hipótese complementar de interpretação, que - penso - não exclui o que eu disse, antes se integra. Digamos que essa é uma forma de os pais dizerem ao mundo: «ele é assim mas eu gosto dele na mesma e muito». Contudo, seja qual for a razão, a adopção desse termo «dulcifica», «eufemiza» doença e quase a caricatura. Parece que o termo foi cunhado por uma «asperger» - ao que julgo das tais perfeitamente integrada na sociedade: valerá a pena chamar a estas pessoas perfeitamente «funcionantes» «aspergers»? - e vai daí foi adoptado pelos pais de todos os «aspergers». O seu «terrível» é outra coisa. Primeiro é individual, diz respeito só ao seu filho, e em segundo aborda com humor a situação, sem a caricaturar. Esse termo, por exemplo, eu não o rejeitava.
Como vê, estou consigo... As fronteiras nesta questão são ténues e têm sobretudo a ver com a sensibilidade individual.
Abç
Cara Anabela. Penso que a sua reflexão introduz outro elemento importante na discussão. A questão de o seu filho ser um adulto e não uma criança. Nos pequeninos, a «coisa» ainda escapa e até pode ter «graça» (nessas idades é tudo mais tolerado e eles até se distinguem nalgumas áreas, não é...), agora nos outros... Talvez seja por isso que eu tb reajo mal ao uso da expressão...
Obrigado pelo seu comentário.
Caro Asper,
o post obriga, de facto, à reflexão.
Eu nunca utilizei a expressão "aspie" a não ser nos meus comentários aqui no blog. Fi-lo pela simples razão de necessitar de distinguir entre as minhas duas filhas, pois nunca quis mencionar os nomes delas (nem sequer a primeira letra dos mesmos).
Assim, poderia ter dito "a minha filha asperger" mas como ela é ainda pequena e eu tenho, naturalmente, a mania de arranjar diminutivos e "petit noms" a todos aqueles com quem convivo, optei por chamar-lhe "aspie", numa ou outra ocasião.
Não me preocupo nada com isso, nem acho que esteja a tentar adocicar ou a menosprezar seja o que for.
Grave seria não olhar de frente a situação, seria não aceitar que ela é diferente e que precisa de toda a minha ajuda para se integrar no "Planeta Terra". Grave seria identificá-la publicamente, como já vi, através do nome ou de fotografias, pois não somos "donos dos nossos filhos", e mais cedo ou mais tarde temos que lhes prestar contas do que fizemos.
Aceito, porém, que no caso de jovens ou adultos as coisas têm que ser analisadas noutros termos.
Ainda assim, e em jeito de brincadeira, sou tentada a despedir-me com um abraço ao Asperzinho!
P.S.
Respondi à Maria Anjos no post sobre a Esperança, como me foi sugerido, e bem, pelo caro Asper.
Mais um abraço.
Caríssima Simplesmente Maria (mantenho sempre - como vê - as fórmulas de tratamento que dou)
Como se calcula, o «post» não lhe era destinado - apesar de ser uma comentadora assídua e muito apreciada - nem aliás a ninguém. No fundo era destinado a todos e a cada um, eu incluído. Foi, no fundo, uma reflexão comigo próprio e que eu partilhei com todos. Interessante é o que diz sobre a «prestação de contas» aos nossos filhos, esse é um dado novo e sobre o qual eu nunca tinha reflectido e que me parece muito relevante. Quanto aos «petit noms» e diminutivos com que brinda todos «os que conhece» e os que não conhece (acrescento eu) estamos - acredite - perfeitamente elucidados.
Um abraço para si Maria(zinha), é sempre um gosto lê-la e responder-lhe :-)
Agradeço-lhe naturalmente a resposta aqui mesmo à Maria Anjos: há sempre opiniões e dados que podem ser aproveitados por outros, sem prejuízo, naturalmente, de uma outra partilha em canal fechado.
Ser Asperger
Estar sózinho no meio da multidão..
Parece que não ouço ...
Que não sinto igual a ti...
Apenas porquê estou distraído.
Neste meu mundo fantástico.
Não sou capaz de ser fingido.
E não permito uma mentira.
Mas eu sou igual a ti.
Olha bem para mim.
Afinal eu estou vivo .
E moro aqui ao pé de ti.
Esta é a minha visão do asperger que tenho cá em casa.
Este artigo foi publicado numa revista anual "Actus" (apenas em caldas da Rainha)este foi o meu pequeno contributo para descodificar o sindrome
Felismina Viana
Olá Felismina
Obrigado por partillhar este poema connosco: acho que ele diz muito sobre a Síndrome de Asperger...
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