A montante, a jusante & a Einhell
Há uns tempos, num determinado contexto, alguém que prezo falava na integração profissional de aspergers e de como foram infrutíferos os contactos com empresas e com instituições, visando a sua integração. Sendo, porventura, injusto, porque não conheço bem o processo, pareceu-me existir – a julgar pelo que foi dito - na última fase do processo uma abordagem que não foi a melhor. Segundo percebi, a equipa apresentou-se na empresa e/ou instituição, explicou a situação, enquadrou o problema e no final perguntou em que áreas ou sectores poderiam ser colocados os aspergers, sendo remetida pelos empresários/dirigentes/directores para os coordenadores sectoriais. Sinceramente, acho está tudo perfeito até à parte final. Acho que a pergunta final deveria ter sido: «será que podemos agora visitar a fábrica ou a instituição, conhecer o processo de fabrico ou de prestação do serviço, estudarmos as áreas em que os nossos «aspergers» possam eventualmente caber e depois fazermos, se for caso disso, propostas concretas?». É que há, na quase totalidade das empresas e/ou instituições, alguma função que se presta a ser exercida pelos aspergers. Mas tem de ser o lado de cá a analisá-la, não o lado de lá, que pouco sabe sobre as características dos aspergers. E tem de ser o lado de cá a analisar aquela função para aquele caso, nem sequer aquela função para todos os casos.
Vem isto a propósito da notícia que li no Expresso Emprego, de 16 de Junho, sobre a Einhell Portugal. Como poderão ler, se clicarem duas vezes na imagem, a Einhell Portugal empregou cerca de 10 deficientes. A fazer o quê? A separar os componentes para reciclagem de ferramentas eléctricas, separando o que é de plástico, cobre e outros metais. Não me digam que, por exemplo, os nossos aspergers, devidamente monitorizados, não poderiam estar também a fazer este trabalho ou à frente de um tapete rolante a seleccionar os diferentes tipos de lixo para reciclagem?!
Vem isto a propósito da notícia que li no Expresso Emprego, de 16 de Junho, sobre a Einhell Portugal. Como poderão ler, se clicarem duas vezes na imagem, a Einhell Portugal empregou cerca de 10 deficientes. A fazer o quê? A separar os componentes para reciclagem de ferramentas eléctricas, separando o que é de plástico, cobre e outros metais. Não me digam que, por exemplo, os nossos aspergers, devidamente monitorizados, não poderiam estar também a fazer este trabalho ou à frente de um tapete rolante a seleccionar os diferentes tipos de lixo para reciclagem?!
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Etiquetas: Inclusão
17 Comentário(s):
Caro asper,
Não comento sem antes perceber se fala sério ou a brincar...
Caro Asper,
Compreendo a sua preocupação atenta a idade do seu aspie e a dúvida que com certeza o assalta todos os dias: será que ele vai conseguir ser autónomo, ter um emprego, enfim, sobreviver sózinho.Embora, atenta a idade do meu, a preocupação actual seja:será que em Setembro, no 5º ano, com todas as alterações que isso implica, ele será capaz de se orientar e ir para a sala certa, à hora certa, para a disciplina certa?
Confesso-lhe que não sei a resposta às nossas dúvidas, mas sei que uma maior visibilidade do SA na sociedade poderá ajudar os aspies na sua integração no mundo laboral e isso também começa connosco.É que pelo menos eu, nunca tinha ouvido sequer falar do assunto até há alguns meses atrás.Aqui na pequena cidade do inetrior onde vivo vou tentar tornar-me uma activista na divulgação e compreensão do SA por forma a permitir aos nossos "génios atabalhoados" um futuro melhor.
Cara Mrs Noris
Estou a falar de forma seriíssima.
Cara Mariamartin
Infelizmente o meu não é, nem nunca será autónomo. E inclusive perdeu, na idade adulta, algumas das autonomias que havia adquirido. Pessoalmente, já nem pedia muito, pedia apenas uma integração ocupacional em contexto laboral com uma remuneração simbólica...
Caro asper,
A ideia que eu tenho do profissional asperger é que ele é excelente naquilo que faz, até porque só faz aquilo que gosta. Um asperger é motivado pela função, ao contrário de um não asperger, que pode ser motivado por factores externos à função como um chorudo ordenado no final do mês.
É bem verdade que cada caso é um caso, e que os casos são todos diferentes. Por isso não podemos dizer se esta ou aquela função pode ou não ser desempenhada pelos “nossos aspergers”.
Assim, e quanto à questão colocada no final do post, a resposta é sim, desde que o empregado asperger encontre algum fascínio na separação de lixo. Caso contrário, acho que está mais para um tóxicodependente, alcoólico crónico ou presidiário.
Cordiais cumprimentos.
Cara Mrs Noris
É bom esclarecer que ao referir o que referi pensava sobretudo no meu filho e em mais alguns casos que conheço pessoalmente. São, esclareço, geralmente casos de «asperger» com défice cognitivo. Falo-lhe, portanto, de casos reais, concretos, que conheço. Não lhe falo em visões romanescas de alguma literatura, daquela que refere nomes como Newton, Einstein, Bill Gates, etc. E nesse mundo real, de que eu lhe falava, creio que só há um – note bem, «um», acentuo mas não escrevo em maiúsculas – caso de portador de SA diagnosticado que neste momento, em Portugal, se encontra a trabalhar. E nem sequer tem défice cognitivo. Portanto, lamento dizer-lhe, o «profissional asperger» de que fala não existe. E creio que a infelicidade e a frustração que o meu filho sente por estar onde está seria bastante minorada por uma função qualquer onde ele se sentisse útil e por uma integração em contexto social. Claro que lhe continuo a falar de um caso real e não em efabulações romanescas, de cuja base científica, enquanto observador crítico, me permito, pelo menos, questionar.
Caro asper,
Se calhar o problema é estarmos a dar o mesmo nome a coisas diferentes. Trata-se duma ideia demasiado recente. Eu acredito que uma grande parte dos aspergers sejam pessoas com a inteligência acima da média que podem desempenhar, por exemplo, profissões académicas que façam render as suas capacidades e interesses. Mas graças a uma perspectiva que os considera deficientes (como o Rainman), uma grande parte dos aspergers não é considerado como tal pelos médicos devido à sua inteligência e grau de adaptação que torna a sua condição muito ligeira, no fundo do espectro. Por se tratar dum autismo ligeiro e por vezes residual que se encontra em pessoas funcionais com algumas características peculiares, talvez os psiquiatras portugueses(não vou acentuar "portugueses") só o diagnostiquem em pessoas com características visíveis. Talvez os psiquiatras confundam SA com autismo e como não conhecem bem o síndrome, preferem abster-se de diagnosticar, logo só são diagnosticados os autistas com défices cognitivos, portanto a população asperger é reduzida a estes, originando essas estatisticas.
Parece-me que as pessoas com anomalias profundas não deviam ser diagnosticadas com asperger. De qualquer forma, acho que um emprego seria um meio de aumentar, e não de minorar, a infelicidade e a frustração daqueles que apresentam dificuldade de integração nesta sociedade, a não ser que, e acentuo repetindo, gostem muito daquilo que fazem.
Cara Mrs Noris
Pessoas que podem desempenhar «profissões académicas» e «pessoas funcionais com algumas características peculiares» não são «aspergers», nem há qualquer necessidade de terem esse ou qualquer outro rótulo. Já aqui dei o exemplo do «ansioso» que me parece bom. Eu posso ser «ansioso» sem sofrer de ansiedade. A «ansiedade» só se torna um problema quando atinge o nível patológico que me limita as interacções. O número que eu referi não é estatístico, porque não há estatísticas; foi-me dado pelo clínico do meu filho que lida de perto com esta problemática. Aliás, esse «um» que referi tem até formação académica de nível superior e está a fazer um trabalho rotineiro numa grande empresa. E penso que se pesquisar no universo APSA, esse número não será maior. Não sei se as pessoas com anomalias graves devem ou não ser diagnosticadas como tendo SA - parece-me, contudo, melhor isso do que o inverso: pessoas que têm um funcionamento «peculiar» mas «funcional» serem-no -, o que sei é que o actual diagnóstico de SA não é consensual. No que se refere ao meu filho, porém, e depois do que li, é o que mais próximo da realidade dele está. E olhe que ele já teve vários diagnósticos. Até «traços de sobredotação» - seja lá o que isso for - ele já teve e andou dois anos num colégio de sobredotados. Veja bem! E hoje está como está! Nunca acreditei em nenhum dos diagnósticos que me foram «vendidos», com mais ou menos roupagem científica, mas acredito no de SA ainda que lhe venham a dar outro nome qualquer. Aliás, o problema não é português, é internacional. O DSMIV é a este respeito paradigmático. Avançar com expressões como «atraso clinicamente significativo» sem critérios de mensuração não é nada e deixa quase tudo ao livre-arbítrio de quem diagnostica. E, no outro extremo - mais «popular», digamos assim - se der uma espreitadela à Wikipédia verá que no artigo sobre SA é feito um alerta para a falta de consenso do que lá é dito
Para concluir, volto novamente ao meu filho, que é o conheço melhor, acho que apesar dos resultados escolares não serem brilhantes, ele se sentia melhor e mais feliz na escola do que agora na associação em que está, pelo que a minha proposta do tipo de funções que propus se mantém. Querer mais do que isso seria desajustado. É que, entre outras características, eu tenho 20 anos de experiência com este «problema» e os pés assentes na terra...
Olá caro asper
Cada vez que entro no seu blog encontro uma alma gémea...
Parece-me que as nossas preocupações estão em sintonia, talvez por lidar-mos com a mesma patologia.
Leio atentamente todos os seus comentários e encontro tantas semelhanças, que é quase o meu reflexo, andei tantos anos a pensar que o meu filho era o único e afinal tinha um gémeo aqui por perto.
O meu teêm agora 22anos e este ano deu entrada no CAO.
Após ter completado o 11º.ano e frequentado algumas disciplinas do 12º e ainda um curso de formação profissionalde 4 anos na área do teletrabalho(com sucesso).
Fez um estágio de 6 meses a conferir facturas o que fazia na perfeição não deixava escapar um cêntimo, mas á sempre um mas as perguntas inoportunas e fora de contexto deitaram tudo por terra.
Na instituição existem várias valências, iclusive sugeri contagem de flores, mas até as flores têm que se lhe diga, e não foi possível.
Disseram-me que só ima empresa familiar.
Vamos lá pais de Aspies temos todos de fundar uma empresa para os nossos filhos terem uma oportunidade...
Só visto não é?
Com um abraço
Maria Viana
Cara Maria Viana
Não sabia que era mãe de um «asperger» adulto. A sensação que sempre tenho é que maioria das comentadoras (e dos comentadores; muito menos estes, porque será?!) são mães (pais) de «aspergers» crianças ou jovens. Pois o seu percurso é, de facto, semelhante ao meu. O meu filho concluiu o 10.º ano. Teve uma curtíssima (de dias) experiência frustrada num curso de formação profissional e entrou num CAO. Parece-me que o seu filho é mais competente do que o meu mas no essencial a situação assemelha-se. A sua ideia de uma empresa familiar é efectivamente excelente e poderia bem ser uma das hipóteses para resolver alguns casos. Não sei se sabe mas a APSA tem em marcha um projecto denominado APSA Futuro, inspirado numa experiência holandesa, que poderá também ele contribuir para alterar este estado de coisas.
Um abraço
Caro Asper e Maria Viana,
Na verdade parece-me que a maior parte de nós é pai ou mãe de aspies crianças e por isso não têm (ainda?) a vossa perspectiva da situação.Confesso ke me preocupa o ke o futuro me vai trazer pois uma das coisas ke nos chama mais a atenção no nosso menino de 9 anos é ke ele está sempre igual a kuando tinha 5 anos:as mesmas brincadeiras,as mesmas dificuldades, os mesmo desenhos animados, parece ke só cresce fisicamente e, a ser asssim, talvez um dia eu me veja confrontada com os vossos problemas de integração.
Enfim, veremos, uma preocupação de cada vez!
Caro Asper e demais pais/mães:
apesar do humor com que procuro encarar o dia-a-dia como mãe de uma menina de seis anos (que ainda não tem diagnóstico seguro), sinto alguma apreensão com o futuro, sobretudo depois de ter conversado e ouvido pais/mães de jovens/adultos com "SA" (ou autismo, mais ou menos leve).
Relativamente ao "post", concordo que um dos papéis da APSA poderia ser o de "empresa de recrutamento", com uma base de dados dos potenciais trabalhadores rigorosa e realista (no que concerne às suas capacidades) a quem as empresas poderiam recorrer, indicando o perfil do trabalhador que procuravam. Claro que esta ideia implica uma alteração legislativa no sentido de se impôr às entidades empregadoras uma quota mínima para terem ao seu serviço trabalhadores com problemas dentro do espectro do autismo (por muito que esta especifcação possa desagradar por eventualmente ser discriminatória).
Enquanto assim não for, vão sempre optar por deficientes físicos em detrimento dos demais.
A ideia de uma empresa familiar parece-me também bastante boa, assim como a que está a tentar ser desenvolvida pela APSA Futuro.
Sei que terei o caminho mais desbravado quando for a minha vez de o "atravessar". E sei que, apesar de procurar ajudar o mais que puder, tenho sempre as "baterias" apontadas para a fase escolar - com o intuito de ajudar o mais possível a minha filha (mas também com a esperança de poder ajudar no "caminho" os pais e mães dos bébés ou dos asprgers que ainda estão por nascer).
A todos os que vão à minha frente: tenho muito respeito por todos vós e pela experiência de vida que carregam.
Obrigada.
Cara Mariamartin
Faz muito bem. É mesmo o mais sensato que há a fazer.
Sabe que depois de escrever o «post» e de ver os comentários, acabei por me arrepender, não de o escrever, mas de usar a expressão os «nossos asperger» que senti como abusiva e intrusiva. Porém, entre ganhos e perdas, e pensando em mim – é um pouco como quando compramos presentes para os outros, em que acabamos por reflectir neles os nossos próprios «gostos» - gostaria de ter lido este blogue quando o meu filho tinha a idade do seu.
Um abraço
Cara Maria
Acho que coloca duas questões muito pertinentes, a da alteração legislativa e a da deficiência física versus deficiência mental. Cada uma delas dava muitos e muitos «posts». Aliás, como provavelmente notou, a Einhell integrou deficientes físicos. Como uma das candidatas à CML tem feito várias acções junto de deficientes físicos e o PR tem um roteiro para a inclusão onde inaugura «lares» para deficientes mentais. É infelizmente esse o panorama…
Caro Asperger,
Concordo plenamente consigo quando diz que os nossos Aspies seriam muito mais felizes se tivessem uma ocupação profissional e não só uma ocupação de tempo como é o caso dos nossos neste momento.E francamente sinto alguma revolta por teremos investido na formação para agora os arrumar-mos na prateleira, que eu considero injusto pois continuo a acreditar que o meu filho têm capacidades para não ser um parasita da sociedade.Tenho conhecimento desse projecto na Holanda, não sabia é que a Apsa estava com esse projecto em mãos.
Desejo que ainda venha a tempo de incluir os nossos adultos.
Embora seja também uma forma de segregação do mal o menos.
Que eu continuo apesar de todas as vissicitudes achar que o meu filho é um cidadão com plenos direitos, que na idade adulta deixam de estar salvaguardados.
Não irei baixar as braços.
com um abraço
Maria Viana
Caro Asper,
Já há algum tempo que frequento o seu cantinho e com vontade de fazer a mesma coisa: divulgar, lucidamente, a realidade não romantizada do autismo em Portugal. Sem rodeios e, ainda assim, paciententemente, como os seus textos e respostas.
O meu filho tem quase 4 anos e um futuro redondo de ingónito à sua frente. Assim como o nosso que depende, em larga escala, do dele. Fartos de andarmos às bolandas de terapeuta em terapeuta e de especialista do bairro a literato-mor do burgo, decidimos colher o melhor que as diversas pessoas que passaram pela vida do Guilherme tiveram para nos ensinar e formular um programa com base naquilo que acreditamos. E estamos no princípio. Com a grande dedicação e ajuda de duas terapeutas incansáveis, de uma mãe-Duracell em modo contínuo e eu, a fazer as vezes de pai, background técnico, pequeno interventor e grouppie oficial. O que for acontecendo aqui em casa, vamos relatando. A vossa paciência e compreensão para a diminuta capacidade organizativa. Já nos é difícil na vida real ter a casa arrumada. Aqui serve-se tudo em guardanapos.
Agradecemos desde já a vossa presença na nossa experiência. Estamos disponíveis para partilhar resultados, alegrias e tristezas. Estamos no princípio. Passem por lá. Obrigado Asper. Tudo de bom.
Caro Pai
Óptimo! Seja bem-vindo à blogosfera e felicidades no percurso do Guilherme. Irei acompanhar com atenção o seu blogue.
Um abraço
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